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11/04/2022

MICHAEL HUDSON
O euro que o dólar comeu

Michael Hudson, Site do autor, 7/4/2022
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

Agora já se pode ver com clareza que a escalada atual da Nova Guerra Fria foi planejada há mais de um ano, com estratégia séria associada ao plano dos EUA para bloquear o gasoduto Nord Stream 2, como parte de seu objetivo de impedir a Europa Ocidental (a “OTAN”) de buscar prosperidade mediante comércio e investimentos mútuos com China e Rússia.

Como o presidente Biden e os relatórios de segurança nacional dos EUA anunciaram, a China estava definida como o principal inimigo. Apesar do papel útil que a China teve, ao permitir que os EUA corporativos reduzissem salários do trabalho, enquanto se desindustrializava a economia dos EUA em favor da industrialização chinesa, o crescimento da China foi apresentado como o Terror Supremo: alguém que alcançava a prosperidade pela via do socialismo.

A industrialização socialista sempre foi percebida como o grande inimigo da economia rentista que tomou conta da maioria das nações no século desde o fim da Primeira Guerra Mundial, e especialmente desde a década de 1980.

O resultado hoje é um choque de sistemas econômicos – industrialização socialista versus capitalismo financeiro neoliberal.

Isso faz da Nova Guerra Fria contra a China um ato implícito de deflagração do que ameaça ser uma longa Terceira Guerra Mundial. A estratégia dos EUA é afastar os aliados econômicos mais prováveis da China, especialmente Rússia, Ásia Central, Sul da Ásia e Leste Asiático. A questão era por onde começar a forçar o racha e o isolamento.

A Rússia pareceu ser a maior oportunidade para começar o racha, distanciando-a da China e também da eurozona da OTAN. Elaborou-se uma sequência de sanções cada vez mais severas contra a Rússia – que se esperava que fossem fatais –, para impedir que a OTAN negociasse com ela. Só faltava, para desencadear o terremoto geopolítico, um casus belli.

Não foi difícil arranjar o ‘item’ que faltava. A escalada da Nova Guerra Fria poderia ter sido lançada no Oriente Próximo – por resistência à apropriação dos campos de petróleo iraquianos pelos EUA, ou contra o Irã e os países que o ajudam a sobreviver economicamente, ou na África Oriental. Planos para golpes, revoluções coloridas e mudança de regime foram elaborados para todas essas áreas, e o exército dos EUA na África foi construído com extrema rapidez nos últimos dois anos. 

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FAUSTO GIUDICE
Bucha, uma Timişoara do século 21

Fausto Giudice, Tlaxcala, 9/4/2022
Traduzido pelo
Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

Dia 1º de abril de 2022, o prefeito de Bucha, subúrbio residencial de 36 mil moradores a noroeste de Kiev, anuncia que a cidade teria sido “liberada” no dia anterior, 31 de março, dos ocupantes russos. Ao mesmo tempo, a polícia ucraniana anunciou que havia lançado uma caçada aos “sabotadores” e “agentes russos disfarçados de civis”. Dia 2 de abril, o advogado ucraniano Ilya Novikov publicou, em sua página de Facebook, um vídeo extraído de uma página ucraniana em Telegram, com um minuto e nove segundos de duração, mostrando um comboio de tanques ucranianos descendo uma rua em Bucha. Doze corpos podem ser contados, um dos quais tem as mãos atadas às costas com uma bandagem branca.


Nas horas que se seguiram, toda a “midiasocialesfera”, e depois a grande mídia, enlouqueceram. “Os russos cometeram crimes de guerra em Bucha, massacraram 300 civis”. Ninguém viu os tais 300 cadáveres. Algumas fotos mostram sacos pretos dos quais se diz que conteriam cadáveres. Por mais que se deseje acreditar, digamos assim, que contivessem cadáveres, nem assim se tem qualquer informação sobre quando e como aquelas pessoas teriam morrido. As fotos e vídeos sucederam-se num caos total: o mesmo suposto cadáver aparece em fotos diferentes em lugares diferentes. Os corpos aparecem, desaparecem, reaparecem com detalhes diferentes. Algumas fotos mostram corpos com as mãos atadas atrás das costas, outras com braçadeiras brancas nos braços. Durante o mês em que as tropas russas ocuparam Bucha e arredores, os civis foram instruídos a usar braçadeiras brancas para mostrar que eram civis não hostis. Os civis, militares e paramilitares ucranianos usavam braçadeiras azuis.

Os militares russos, de acordo com a narrativa dominante, estariam matando civis que não lhes eram hostis. ‘Logo’ – rezaria a ‘conclusão’ – seriam tão loucos quanto seu líder, Putin, o Grande Satã de 2022.

Depois e ao mesmo tempo que a mídia e as redes sociais, entraram no baile também os políticos: Joe Biden, Ursula von der Leyen, Josep Borrell, todos denunciam o “crime de guerra de Bucha”. Foi negado à Rússia o direito de falar e votar no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Zelensky, o “servo do povo”, eterno inabalável herói de telenovela sem fim, pede um “Tribunal de Nuremberg para Putin”.

E finalmente, lá está o próprio Papa, em cena digna de Nanni Moretti, brandindo e beijando uma bandeira ucraniana “da cidade martirizada de Bucha”, durante uma cerimônia na qual ele dá ovos de Páscoa às crianças ucranianas.

Nenhum meio de comunicação que publicou fotos ou o vídeo da cena explicou o que estava escrito na bandeira: “Quarta Centúria Cossaca de Maidan”.

“Centúria” (“sotnya”) era a unidade básica das tropas cossacas dos vários exércitos em que serviam. Durante o que a Rádio Europa Livre chamou de “Euromaidan” de 2013-2014, o serviço de segurança organizado pelo político, inicialmente neonazista conhecido, depois cata-vento, Andriy Parubiy, foi estruturado em grupos que levavam nomes poéticos, desse tipo, evocando o “passado glorioso” ucraniano; em outras palavras, evocando a luta contra o “Judeo-Bolshevismo”.

Mas e quanto à “Bucha”. Por que Bucha? Porque, em inglês, Bucha inevitavelmente evocaria butcher, “açougueiro”? E quem seria o açougueiro-em-chefe de Bucha? Há duas teorias: para uns, seria Azatbek Asanbekovitch Omurbekov; para outros, Serhii Korotkykh.

16/03/2022

GILAD ATZMON
A Guerra de Putin explicada aos manequins (no poder)


Gilad Atzmon, 13/3/2022
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

Putin não é general militar. Putin é líder moderno, espião supertreinado e estrategista que entende que a guerra é (mesmo!) continuação da política por outros meios (Clausewitz). Assim, se quisermos entender os motivos de Putin, melhor nos abstermos de tentar avaliar em termos de ‘objetivos militares rigorosos’, a campanha militar da Rússia. Em vez disso, melhor olhar para a campanha militar como se olha para instrumento político definido para mobilizar uma mudança geopolítica global e regional e em escala gigantesca.


É bem claro que o exército de Putin está fazendo o possível para evitar baixas civis. E está usando táticas de cerco, em oposição à doutrina bárbara dos EUA, de ‘Choque e Pavor’. Além disso, os militares russos trabalham duro para não desmantelar as forças militares ucranianas. Em vez disso, cercam as cidades e estão eliminando o exército ucraniano no leste e no sul do país. Os militares russos desmantelaram a capacidade da Ucrânia para se reagrupar, e, claro, também a capacidade dos ucranianos para contra-atacar. Analistas militares ocidentais concordam que é evidência clara da crescente deficiência do exército ucraniano o fato de o exército ucraniano não ter podido danificar seriamente o comboio russo de 60 km a caminho de Kiev. Isso, apesar de o comboio ter ficado parado por mais de 10 dias.

Nas últimas 24 horas, a Rússia deixou claro para o Ocidente que qualquer suprimento militar ocidental para a Ucrânia será tratado como alvo militar legítimo. Em outras palavras, o exército de elite ucraniano no Leste é agora força militar defunta; pode defender as cidades, pode montar ataques de guerrilha à logística militar russa distendida, mas não pode se reagrupar em uma força de combate com capacidade para alterar o campo de batalha.

O exército de Putin, como concordam os especialistas militares, possui maciço poder de fogo. Não é segredo que a artilharia da Rússia é força mortal e que não há força que que se iguale a ela em qualquer lugar do mundo. A justificativa militar para isso é bem clara.

A URSS nunca confiou na qualidade e na lealdade de seus soldados de infantaria. Ao mesmo tempo em que contava com o impacto em massa dos soldados, com seus números absolutos, a URSS também inventava os meios, a tecnologia, as táticas e a doutrina para vencer a batalha de longe, em preparação para a entrada das massas. Foi a artilharia Vermelha que derrubou o Exército do Reich. Da mesma forma, a capacidade para pôr por terra cidades inimigas é o que fez a fama da URSS e da Rússia moderna.

A Rússia goza desse poder, mas se absteve, até agora, de fazê-lo valer na Ucrânia. A Rússia demonstrou que tem essa capacidade, em vez de implantá-la.

Segundo analistas militares, a Rússia sequer começou a utilizar seu poderio aéreo superior. E tem usado apenas o mínimo necessário para assegurar total superioridade aérea sobre a Ucrânia.

A tática do exército russo tem sido aumentar a pressão nos arredores das cidades, demonstrando o poderio militar russo e abrindo corredores para comboios humanitários. E esse é o truque.

A Rússia está criando uma enxurrada de refugiados para o ocidente. Dado que o governo ucraniano proibiu que homens de 18 a 60 anos deixem o país, estamos falando de mulheres e crianças. Até agora, são cerca de 2,5 milhões de refugiados ucranianos, mas esse número pode aumentar drasticamente.

E surge a pergunta: a Alemanha ficará feliz em aceitar outro milhão de refugiados que não são força de trabalho? E o que farão França e Grã-Bretanha, EUA, Canadá, todos aqueles países que empurraram Zalansky e a Ucrânia para uma guerra, sim, mas foram rápidos ao abandonar o povo ucraniano à própria sorte.

Mais cedo ou mais tarde, Putin acredita, a Europa aceitará toda a sua lista de exigências e suspenderá a lista de sanções, podendo até compensá-lo por perdas nas vendas de petróleo, tudo na tentativa desesperada de deter o tsunami de refugiados ucranianos. Quando as armas esfriarem, muitos ucranianos podem preferir ficar na Alemanha, França, Grã-Bretanha e Polônia.

Isso levará, pelo menos no cálculo de Putin, a uma mudança demográfica no equilíbrio étnico em favor dos grupos étnicos russos na Ucrânia. No contexto dessa mudança, Putin poderá dominar a situação no estado vizinho, por meios políticos e até democráticos.

O plano de Putin não é novo. Já foi usado, com sucesso, na Síria.

Quando o Ocidente percebeu que a Síria estava a pé, caminhando para a Europa, foi muito rápido ao permitir que Putin ganhasse a batalha por Assad, à custa da hegemonia americana no Oriente Médio. Putin agora emprega basicamente as mesmas táticas. Pode ser cruel ou mesmo bárbaro, mas estúpido ou irracional não é.

A questão principal é: como é possível que toda a elite política e ‘midiática’ ocidental não tenha sequer qualquer mínima ideia sobre os movimentos de Putin e da Rússia? Como é possível que nenhum analista militar ocidental seja capaz de ligar os pontos e ver através da névoa dessa guerra horrível?

22/12/2021

PEPE ESCOBAR
Putin e Xi, para escapar da guerra híbrida de Biden

 Pepe Escobar, Asia Times, 16/12/2021 

Traduzido pelo Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

 

“Ainda que só imaginando que a Rússia realmente “entre” nessa guerra [pela posse da Ucrânia], a preocupação principal dos russos não será a posição do ocidente – ninguém acalenta qualquer ilusão sobre isso no Kremlin, o qual, afinal, é só o que conta. – A preocupação dos russos é o fato de que a Rússia terá de lidar com população na maioria hostil, humilhada (e derrotas militares são extremamente dolorosas) e realmente reduzida à miséria mais feroz, de algo entre 20 e 25 milhões de pessoas. Quem precisa disso?! Como se diz nas ruas da Rússia: para ser ocupado pelos russos, o país tem de fazer por merecer” (“Fala o diretor do Serviço de Inteligência Exterior da Rússia. Naryshkin Verbatim, 27/11/2021, Andrei Martyanov, Blog Reminiscence of the Future).*

 

Captura de tela da recente conversa telefônica entre Xi Jinping e Vladimir Putin. Mikhail Metzel / Pool / TASS


Xi Jinping e Vladimir Putin conversaram por vídeo, durante uma hora e 14 minutos, na 4ª-feira passada. Geopoliticamente, pavimentavam o caminho para 2022, e isso é o que realmente importa – muito mais que
Putin-Biden na semana passada.

Dmitry Peskov, secretário de imprensa do Kremlin, que em geral pesa cuidadosamente cada palavra, já havia sugerido que essa conversa seria “extremamente importante”.

Era óbvio que os dois líderes não se limitariam a trocar informações sobre o gasoduto para gás natural Poder da Sibéria 2. Peskov referia-se a geopolítica de primeiríssima ordem: como Rússia-China passariam a coordenar seus contragolpes contra o combo de guerra híbrida/Guerra Fria 2.0 de que se servem os EUA e aliados.

Embora ninguém espere vazamentos substanciais desde o 37º encontro de Xi e Putin em 2013 (vão encontrar-se pessoalmente outra vez em fevereiro de 2022, na abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim), o Conselheiro Presidencial do Presidente para Política Exterior, Yuri Ushakov deu jeito para trazer a público pelo menos dois importantes bits de informação.

Eis os destaques da conversação:

  • Moscou informará Pequim sobre o progresso, ou ausência dele, nas negociações com EUA-OTAN sobre garantias de segurança para a Rússia.
  • Pequim apoia as demandas de Moscou à EUA-OTAN relacionadas àquelas garantias.
  • Putin e Xi concordam com criar “uma estrutura financeira independente para operações comerciais que não possa ser influenciada por outros países.” Fontes diplomáticas dizem, off the record, que a estrutura será anunciada em evento conjunto no final de 2022.
  • Discutiram a “Cúpula pela Democracia” da qual Biden foi o anfitrião, concluindo que foi contraproducente e impôs novas linhas divisórias.

De tudo isso, o terceiro ponto é realmente o mais decisivo – já em construção há alguns anos, e ganhou impulso definitivo depois que os falcões da guerra em Washington, tipo Victoria “F*da-se a União Europeia” Nuland voltou a ventilar a ideia de expulsar a Rússia da Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunications, SWIFT – a vasta rede de troca de mensagens usadas por bancos e outras instituições financeiras para trocar instruções para transferência de dinheiro. A ideia de Nuland ressurgiu com o pacote ‘final’ de sanções a serem aplicadas à Rússia, como represália por ‘invadir’ a Ucrânia – invasão que nunca aconteceu.

13/12/2021

PEPE ESCOBAR
“Reconquista”: Em 2022, um argelino islamofóbico quer ‘limpar’ a França do ‘perigo muçulmano’

Pepe Escobar, The Cradle, 9/12/2021

Traduzido pelo Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

“— Re quê?, indagou Bianchon.
— Re-toque.
— Re-trato.
— Re-talho.
— Re-tranca.
— Re-truque.
— Re-treta.
— Re-tinto.
— Re-torama.

Essas oito respostas partiram de todos os lados da sala com a rapidez de uma fuzilaria e se tornaram ainda mais engraçadas porque o pai Goriot olhava para os convivas com expressão aparvalhada, como alguém que procura entender uma língua estrangeira.”

Pai Goriot
, Balzac, 1835, tradução e notas de Paulo Rónai,
aqui, pág. 71*

 

https://media.thecradle.co/wp-content/uploads/2021/12/1-1200x567.jpg 

Francês islamofóbico e candidato à presidência, Eric Zemmour magnetiza a extrema direita com suas polêmicas racistas. Nome de família judeu berbere da Argélia, Zemmour significa azeitona em berbere e “buzina” em árabe. Foto: The Cradle


Em agudo contraste com o ambiente político moroso por toda a Europa, a eleição na França – contra todas as probabilidades – promete agora se tornar uma das disputas mais interessantes que teremos em 2022.
Justo quando todos, da Normandia à Côte d’Azur pareciam já conformados a sofrer um segundo surto de macronismo, Eric Zemmour, polemista convertido em político, aparece com uma reviravolta no enredo.
E precisou menos de uma semana. Na 2ª-feira, 29 de novembro, Zemmour
anunciou oficialmente  que concorrerá às eleições. Chegou com cenário completo à De Gaulle, lendo discurso ao som de Beethoven, frente a um microfone antiquado e cercado por livros.
Ali Zemmour anunciou o nome de seu novo partido político: ‘Reconquista’ – inspirado na batalha de sete séculos que os cristãos tiveram de enfrentar para expulsar os mouros da Ibéria, o que afinal conseguiram em 1492.
Para Zemmour e seus ávidos acólitos, trata-se simplesmente de reconquistar a França, arrancando-a outra vez das mãos do inimigo muçulmano.
Depois, no domingo, 5 de dezembro, realizou
seu primeiro comício de candidato diante de mais de dez mil pessoas. Nenhum político francês hoje consegue arrastar semelhante multidão.

18/09/2021

MATTHEW EHRET
Se os Talibãs fizerem o jogo certo, Afeganistão pode mudar história da Rota da Seda na Ásia Ocidental


Matthew Ehret, The Cradle, 14/9/2021
Traduzido pelo
Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

Considerado no passado “pérola orgulhosa” da antiga Rota da Seda, o Afeganistão está hoje em frangalhos. Mas se os Talibã fizerem o jogo certo, a Rota da Seda Asiática pode mudar a sorte daquele país destroçado pela guerra.
“A natureza tem horror ao vácuo”, e um dos maiores vácuos na história recente aí está, à espera de ser preenchido, tão logo os anglo-americanos partam do Afeganistão depois de estadia de 20 anos, milhões de vidas perdidas e mais de $2,2 trilhões gastos para mandar de volta à Idade da Pedra aquela ‘pérola orgulhosa’ da Antiga Rota da Seda.

A questão agora é: que papel terá a sempre crescente Iniciativa Cinturão e Estrada, chinesa, nessa região e, de modo mais amplo, em toda a Ásia Ocidental?

14/09/2021

ALASTAIR CROOKE
Microcosmo do ‘Grande Reset’: a ‘derrota orientada por dados’ no Afeganistão

Alistair Crooke, Strategic Culture Foundation, 30/8/2021
Original:
The ‘Great Reset’ in Microcosm: ‘Data Driven Defeat’ in Afghanistan
Traduzido pelo
Coletivo de Tradutores Vila Mandinga
Version française: La bulle du « Grand Reset » : une ‘défaite fondée sur les données’ en Afghanistan

https://bloximages.chicago2.vip.townnews.com/madison.com/content/tncms/assets/v3/editorial/1/28/128fb921-c461-5817-b75d-cb935645b816/6079c166bbfef.preview.jpg?crop=768%2C576%2C16%2C0&resize=1200%2C900&order=crop%2Cresize 

O programa ‘construir-nação’ chegou em 2001 ao Afeganistão. As intervenções ocidentais no velho bloco oriental nos anos 1980s e primeiros anos da década seguinte foram espetacularmente efetivas para destruir a velha ordem social e institucional; mas foram também espetaculares no fracasso: não conseguiram substituir, por sociedades movidas por instituições novas, as sociedades implodidas.

O novo mantra para todo o planeta passou a ser a ameaça que seriam para todo o planeta os ‘estados falhados’, e o Afeganistão – consumada a destruição decidida depois do 11/9 – precisaria de intervenção de forças externas. Estados fracos e falhados criariam terreno fértil para o terrorismo; e com ele vinha a correspondente ameaça à ‘ordem global’, como então se dizia. O Afeganistão teria de ser o berço de uma nova visão liberal de mundo.

Em outro nível, a guerra no Afeganistão tornou-se
outro tipo de cadinho. Em termos muito concretos, o Afeganistão converteu-se em campo de testes de toda e qualquer inovação em matéria de projeto de tech menagement – gerenciamento tecnocrático. – Cada inovação foi apresentada como precursora de futuro cada vez mais amplo para todos. Abundaram os financiamentos: ergueram-se prédios, e um exército de tecnocratas globalizados desembarcou no Afeganistão para supervisionar o processo. Big data, Inteligência Artificial e conjuntos sempre crescentes de métricas técnicas e estatísticas, com certeza derrubariam as velhas ideias ‘indigestas’.

Sociologia militar aplicada por ‘Human Terrain Teams’ [equipes encarregadas de mapear as populações, definidas como “Terreno Humano”] e outras criações inovadoras, foram disparadas com a missão de impor ordem ao caos. Aqui, a força total de todo o planeta-ONGs, as mais brilhantes mentes daquele governo internacional presuntivo, ganharam um playground com recursos praticamente infinitos à sua inteira disposição.

Tudo estava pensado para que o Afeganistão fosse a vitrine-show do
gerencialismo tecnológico. Presumiu-se que um modo adequadamente técnico e científico de compreender a guerra e a construção-de-nações conseguiria o que ninguém jamais conseguira, e assim se criaria uma sociedade pós-moderna, extraída diretamente de uma complexa sociedade tribal, com sua específica história narrada.

O ‘novo’ chegou, como se viu, embalado numa torrente de caixotes de ONGs marcadas como ‘modernidade pop-up’ [‘modernidade’ que abre automaticamente na tela do computador...].

12/09/2021

PEPE ESCOBAR
O que esperar dos Talibã 2.0

Pepe Escobar, Asia Times, 8/9/2021
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

O anúncio dos nomes dos ministros do gabinete do novo governo interino do Emirado Islâmico do Afeganistão, pelo porta-voz dos Talibã Zahibullah Mujahid, em Cabul, já provocou grande tumulto: conseguiu enfurecer os dois lados, o OTANistão woke,[i] e o Estado Permanente (orig. Deep State, lit. “Estado Profundo”[ii) dos EUA.

A lista dos ministros

É gabinete formado só de homens, predominantemente pashtuns (há um uzbeque e um tadjique), prêmio à velha guarda dos Talibã. Os 33 membros do gabinete de governo do Afeganistão são Talibãs.

Mohammad Hasan Akhund – que presidiu a Rehbari Shura Talibã, ou Conselho de Líderes, por 20 anos – será o primeiro-ministro interino. Para todas as finalidades práticas, Akhund é considerado terrorista pela ONU e pela União Europeia, e está sob sanções do Conselho de Segurança da ONU. Não é segredo que Washington considera Organizações Terroristas Estrangeiras [ing. Foreign Terrorist Organizations] algumas facções dos Talibã; e que os Talibã carregam uma sanção especial como organização “Terrorista Global”.

É crucial salientar que Himatullah Akhundzada, Líder Supremo dos Talibã desde 2016, é Amir al-Momineen (“Comandante dos Crentes”). Não pode ser primeiro-ministro; seu papel, como líder supremo espiritual, é fixar orientações para o Emirado Islâmico e mediar disputas – incluídas as disputas políticas.

Akhundzada distribuiu uma declaração na qual se lê que o novo governo “trabalhará muito para manter as regras do Islamismo e a lei da sharia no país” e garantirá “paz, prosperidade e desenvolvimento duradouros”. Acrescentou que “o povo não deve tentar deixar o país”.

05/09/2021

PEPE ESCOBAR
De volta para o futuro: Talibanistão, 2000... 2010... 2021

 Pepe Escobar, The Saker, 31/8/2021 

Traduzido pelo Coletivo de tradutores Vila Mandinga 

Caro leitor: vamos sentar, relaxar e viajar, pela memória, até tempos pré-históricos – ao mundo pré-11/9, pré-YouTube, pré-Facebook. Bem-vindos ao Afeganistão dos Talibã – o Talibanistão – dos anos 2000.
Foi quando Jason Florio, fotógrafo sediado em New York (veja seu Diário Afegão),  e eu atravessamos sem pressa as terras do Talibanistão, de leste a oeste, da fronteira com o Paquistão em Landi Kotal à fronteira com o Irã em Islam Qillah.
Como atestaram muitos dos que trabalhavam em serviços de ajuda humanitária no Afeganistão, Jason e eu fomos os primeiros a ocidentais a aparecer por lá, em muito tempo.


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Fátima, Maliha e Nouria, em casa, em Cabul

Que dias, aqueles! Bill Clinton curtia suas últimas aventuras na Casa Branca. Osama bin Laden não passava de hóspede discreto do Mulá Omar – e só ocasionalmente chegava às primeiras páginas dos jornais. Ninguém suspeitava de que viria o 11/9, ou a invasão do Iraque, ou a “guerra ao terror”, nem se cogitava de reposicionar a griffe ”guerra do Af-Pak”, nem de uma crise financeira global. Reinava a globalização, e os EUA eram, sem quem o desafiasse, o cão-alfa. O governo Clinton e o Talibã já estavam infiltrados bem fundo no território do Oleogasodutostão – discutindo o tortuoso recém-proposto gasoduto Trans-afegão.

Tentamos de tudo, mas não conseguimos ver, nem de longe, o Mulá Omar. Osama bin Laden também se mantinha afastado de todos os olhares. Mas experienciamos o Talibanistão em ação, detalhadamente.

Hoje é dia especial para revisitar esses escritos. A Guerra Sem Fim no Afeganistão acabou; daqui em diante será um monstro Híbrido, contra a integração do Afeganistão nas Novas Rotas da Seda e na Eurásia Expandida.

Em 2000 escrevi um especial sobre viagem por terra pelo Talibanistão para uma revista política japonesa, já extinta, e dez anos depois, uma série de três artigos em que revisitei a mesma viagem, para Asia Times.
Por que, então, re-revisitá-los vinte anos depois? Culpem a tentação, a isca, da arqueologia e da história. O que se faz aqui é ao mesmo tempo lançar um olhar a um mundo há muito tempo perdido e abrir uma janela para um renovado futuro possível no Afeganistão.

A parte 2 daquela trilogia pode ser encontrada em ing. aqui; em port. aqui; e a parte 3 em ing. aqui; em port. aqui).

Mas o 1º ensaio da trilogia desapareceu da internet (é uma longa história). Por acaso, encontrei-o recentemente num hard drive. As imagens são daquela época, feitas com uma Sony mini-DV: acabo de receber o arquivo, mandado de Paris (aqui, adiante, com algumas poucas atualizações).
É visão breve de um mundo há muito perdido: podem chamar de registro histórico de um tempo quando ninguém sequer sonhava com algum “momento Saigon” remixed – como guarda-chuva reformatado de guerreiros convenientemente rotulados de “Talibã”.

Esses Talibã, 20 anos depois de terem dado tempo ao tempo, bem ao estilo Pashtun, agradecem que Alá lhes tenha dado a vitória sobre mais um invasor estrangeiro.
EUA e OTAN chegariam talvez a algum “momento Saigon” – e partiriam? Em 2000 e em 2010 parecia que não. Enquanto o general David “Sempre de olho em 2012” Petraeus, como seu predecessor general Stanley McChrystal, avançava suas forças especiais, Assassinato Incorporate, para dobrar os Talibãs, o mesmo Petraeus foi capaz de dizer – sem ironia – ao canal Fox News, que o “objetivo último” da guerra seria “reconciliar” o ultracorrupto governo de Hamid Karzai e os Talibãs.

Agora, sim, pé na estrada, de volta para o futuro.

A vida no Talibanistão 
1. Meta esses infiéis na cadeia

2. O grau zero da cultura

3. Casado com a máfia



20/08/2021


COLONEL CASSAD

Talibã amigáveis

Colonel Cassad, 17/8/2021
Traduzido pelo Coletivo de tradutores Vila Mandinga

Colonel Cassad é o pseudônimo de Boris Aleksandrovich Rozhin (Sevastopol, 1981), um popular blogueiro russo.

Os Talibã fizeram sua primeira conferência oficial de imprensa, como novas autoridades afegãs, dia 17 de agosto em Cabul. Além de ler declarações, os Talibã também responderam perguntas de jornalistas.

O principal orador foi o porta-voz dos Talibã, Zabihullah Mujahid.

Nas palavras dele, o Mulá Baradar, que deve assumir como presidente do Afeganistão, já chegou ao país.


 

17/08/2021

PEPE ESCOBAR
Raia em Cabul um momento Saigon

 

 Pepe Escobar, Asia Times, 13/8/2021
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores Vila Mandinga

12/8/2021 entrará para a história como o dia em que os Talibã vingaram a invasão do Afeganistão pelos EUA e assestaram o golpe que derrubou o homem dos EUA em Cabul

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13/07/2021

PEPE ESCOBAR
“Perdido numa selva romana de dor”[1]
Elogio a James Douglas Morrison, poeta do século 20, morto há meio século, aos 27 anos

Pepe Escobar, The Vineyard of the Saker, 3/7/2021

Traduzido pelo  Coletivo de tradutores Vila Mandinga 


Ele foi como o tigre de Blake,
[2] sempre em fogo, e à caça de arco-íris de Rimbaud[3] – para acabar numa banheira, como Marat.[4] Tinha só 27 anos.

Jim Morrison morreu dia 3 de julho de 1971, em Paris. Meio século depois,
The Collected Works of Jim Morrison: Poetry, Journals, Transcripts, and Lyrics celebra luxuosamente a alma do poeta.


Em vida, Jim publicou, ele mesmo, três edições limitadas de sua poesia: The Lords/Notes on Vision (1969), The New Creatures (1969), e An American Prayer (1970).

Agora, afinal, temos acesso a todos os seus escritos, incluído o roteiro para o filme experimental de Jim, 50 minutos,
HWY, filmado ao estilo do cinema-verdade de Godard, na primavera e verão de 1969 em L.A. e no deserto de Mojave, com Jim no papel de um caroneiro de beira de estrada. Amantes de carros antigos gostarão de ver Jim ao volante de seu Mustang Shelby GT 500, no HD clip de um filme inspirado por HWY.

The Collected Works dá a sensação de um colar de fragmentos mágicos de jade, completado com páginas manuscritas em cadernos, palavras rasuradas, sublinhadas, o resultado talvez similar ao ‘Plano para Livro’ que Jim certa vez esboçou.

10/07/2021

Momento Saigon no Hindu Kush

Pepe Escobar, Asia Times, 7/7/2021
Traduzido pelo  Coletivo de tradutores Vila Mandinga 

And it’s all over
For the unknown soldier
It’s all over
For the unknown soldier

The Doors, The Unknown Soldier[1]


Comecemos com alguns espantosos fatos em campo.

Os Talibã estão operando em tempo integral. No início dessa semana, seu braço de Relações Públicas dizia que têm sob seu controle 218, dos 421 distritos afegãos – capturando mais e mais a cada dia. Dezenas de distritos são contestados. Províncias afegãs inteiras são perdidas, basicamente inacessíveis para o governo de Cabul – reduzido, de facto a administrar umas poucas cidades espalhadas pelo país e sob cerco.


Já dia 1º de julho, os Talibã anunciaram que controlavam 80% do território afegão. É próximo do que havia há 20 anos, poucas semanas antes do 11/9, como o
Comandante Masoud me disse, no vale Panjshir, quando preparava uma contraofensiva, que os Talibã dominavam 85% do país.

A nova abordagem tática deles funciona como sonho. Primeiro, há o apelo direto aos soldados do Exército Nacional Afegão, ENA [ing. Afghan National Army, ANA], para que se rendam. Negociações rápidas – e acordos cumpridos. Alguns (poucos) milhares de soldados já se uniram aos Talibã sem que um só tiro tenha sido disparado.

Os responsáveis por construir mapas não têm tempo suficiente para carregar dados atualizados em tempo real. O Afeganistão vai-se rapidamente convertendo em caso exemplar de colapso de governo central em pleno século 21.

Os Talibã estão avançando rapidamente no Vardak ocidental, capturando facilmente bases do ENA. É como o prólogo de um assalto contra Maidan Shar, capital provincial. Se obtiverem o controle de Vardak, estarão literalmente às portas de Cabul.

Depois de capturar o distrito de Panjwaj, os Talibã estão também a uma pedrada de distância de Kandahar, fundada por Alexandre, o Grande em 330 a.C. e cidade onde um certo mulá Omar – com pequena ajuda de seus amigos dos Serviços Especiais paquistanesas (ISI) – iniciou a aventura dos Talibã em 1994, liderando a tomada do poder em Cabul em 1996. 

A grande maioria da província Badakhshan – maioria Tadjique, não Pashtun – caiu depois de apenas quatro dias de negociações, com umas poucas escaramuças. Os Talibã até capturaram um posto de colina, muito próximo de Faizabad, capital do Badakhshan.

Rastreei em detalhe a fronteira Tadjique-Afeganistão, quando
viajei pela estrada Pamir no final de 2019. Os Talibã, seguindo trilhas de montanha do lado afegão, conseguiu alcançar rapidamente a lendária, desolada fronteira com Xinjiang no corredor Wakhan.

Os Talibã estão também próximos de um movimento contra Hairaton, na província Balkh. Hairaton está na fronteira afegã-uzbeque, local da historicamente importante Ponte da Amizade sobre o Amu Darya, pela qual o Exército Vermelho partiu do Afeganistão em 1989.

Comandantes do ENA juram que a cidade está agora protegida por todos os lados por uma zona de segurança de cinco quilômetros. Hairaton já atraiu dezenas de milhares de refugiados. Tashkent não quer que esses refugiados cruzem a fronteira.

E não só na Ásia Central; os Talibã já avançaram até os limites da cidade de Islam Qilla, na fronteira do Irã, na província de Herat, e ponto chave de passagem de fronteira, no muito ativo corredor entre Mashhad e Herat. 

Militantes talibã e aldeões afegãos participam de uma reunião para celebrar o acordo de paz e sua vitória sobre os EUA , no distrito de Alingar, na província de Laghman, em 2 de março de 2020. Foto: AFP / Noorullah Shirzada

05/07/2021

PEPE ESCOBAR
A longa e sinuosa estrada* multipolar

Pepe Escobar, 1/7/2021
Traduzido pelo 
Coletivo de tradutores Vila Mandinga

Vivemos tempos extraordinários.

No dia do 100  aniversário do Partido Comunista Chinês (PCC), o presidente Xi Jinping, na praça Tiananmen, com toda a pompa e circunstância, distribuiu poderosa mensagem geopolítica:


O povo chinês jamais permitirá que forças estrangeiras o intimidem, oprimam ou subjuguem. Quem tente fazer isso logo se verá em rota de colisão contra uma grande muralha de aço forjada por mais de 1,4 bilhão de chineses.


Ofereci
versão concisa (aqui, traduzida ao port.) do moderno milagre chinês – que nada tem a ver com intervenção divina, mas com “buscar a verdade a partir de fatos” (copyright Deng Xiaoping), inspirado por sólida tradição cultural e histórica.

A “grande muralha de aço” evocada por Xi abarca hoje uma dinâmica “sociedade moderadamente próspera” – meta alcançada pelo PPC às vésperas do centenário. Arrancar da miséria 800 milhões de pessoas é feito histórico ainda não igualado – em todos os aspectos.


Criança geopolítica observando o nascimento do homem novo, Salvador Dalí, 1943